Senhor, tu sabes que estou envelhecendo.
Ajuda-me a pensar que não sou uma peça imprestável, no movimento da vida.
Reconheço que não tenho mais as mesmas capacidades físicas, que me animaram
a juventude, nem os mesmos reflexos e disposição. Contudo, auxilia-me a não
desanimar, e muito menos pedir aposentadoria indevida das lides do mundo.
Não me deixes emurchecer, como flor queimada pelo sol.
Não permitas que eu tenha a idéia fixa de falar de mim o tempo todo.
Impede-me de repetir detalhes infindáveis. Dá-me rapidez para que eu seja
objetivo.
Fecha a minha boca quando eu estiver propenso a falar de minhas dores e de
meus sofrimentos. Eles estão aumentando com o passar dos anos, e meu desejo
de falar deles aumenta a cada dia.
Ensina-me a dialogar, sem me fazer excessivamente falador, a fim de não
causar indisposição nos demais.
Não me permitas conceber limitações desnecessárias. Coloca as minhas mãos no
trabalho a fim de que eu elabore ainda criações no campo da música, da
pintura, da jardinagem, da cerâmica.
Ensina-me a melhor ocupação para o tempo que disponho. Um tempo que, desde
os dias da juventude, reclamava não ter.
Permita que eu me levante a cada dia disposto a aprender alguma coisa mais.
Pode ser uma forma diferente de usar o pincel, uma breve poesia, um
ensinamento, uma receita surpreendente.
Desejo ser jovial sem parecer tolo e imprudente.
Torna-me solícito mas não abelhudo. Prestativo, mas não dominador.
Desejo ser um avô que possa contribuir com a educação dos meus netos e não
os deseducar, com a única finalidade de que apreciem sair comigo, nas tardes
de primavera.
Ensina-me, ainda, a gloriosa lição de que, às vezes, posso estar errado.
Aprendi muito, guardo experiências preciosas, mas não tenho o direito de
desprezar os avanços da modernidade e da ciência.
Depois de ter adquirido uma enorme bagagem de sabedoria e experiência,
parece uma pena eu não poder usá-la totalmente, sem criar embaraços aos
demais.
Se a dependência física se tornar necessária, ajuda-me Deus, a ter paciência
comigo mesmo, suportando o corpo que tanto me serviu até aqui.
Com ele eu dancei, cantei, viajei, vivi doçuras, momentos bons e maus.
Auxilia-me a continuar a amá-lo.
Tu sabes que precisarei não ser inconveniente, a fim de não incomodar tanto
aos demais. Por isso, te peço que me ensines a pensar duas vezes, antes de
reclamar, insistir e exigir o que quer que seja, a quem tenha que cuidar de
mim.
Se eu tiver que experimentar a viuvez, dá-me tua mão, quando a da minha
esposa já não estiver por perto. Afinal, Senhor, foram tantos anos em que
despertei ao toque suave do carinho dela.
Não me permitas secar a fonte das lágrimas. Precisarei delas, com certeza,
nas horas de tristeza, para desafogar o coração cansado.
Entretanto, não me deixes tornar um ser melancólico e chorão. Permite-me
gozar do calor do sol e da bênção da chuva, com o mesmo entusiasmo de
sempre.
E, finalmente, Senhor, o meu desejo final é ter sempre alguns amigos. Esses
seres abençoados que, no mar imenso da vida, qual jangada preciosa, remaram
firmemente ao meu lado.
Muitos deles poderão partir antes de mim, mas permite que alguns permaneçam
a fim de que nunca desapareça de vista a expectativa das suas presenças.
Enfim, Senhor, torna-me um ancião nobre, que demonstre a sabedoria do
envelhecimento digno.
A vida é constituída de muitas fases. Aprenda a viver cada uma delas, com
todo o entusiasmo porque a infância, a adolescência, a juventude, a madureza
e a velhice têm cada qual o seu encanto particular.
Não se permita viver sem descobri-lo para jamais se sentir infeliz por
passar de uma fase para outra.
O segredo da felicidade é viver cada dia em plenitude.
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