quarta-feira, 25 de março de 2009

ASSALTO

Na feira, a gorda protestou a altos brados contra o preço do chuchu gritando que era um assalto. Houve um rebuliço, os que estavam perto fugiram. Alguém correndo, foi chamar o guarda. Um minuto depois, a rua inteira, atravancada, mas provida de admirável serviço de comunicação espontânea, sabia que se estava perpetrando um assalto ao banco. Mas que banco? Havia banco naquela rua? Evidente que sim, pois do contrário como poderia ser assaltado? - Um assalto! Um assalto! - a gorda continuava a esguelar, e quem não tinha escutado escutou, multiplicando a notícia. Aquela voz subindo do mar de barracas e legumes era como a própria sirena policial, documentando, por seu uivo, a ocorrência grave, que fatalmente se estaria consumando ali, na claridade do dia, sem que ninguém pudesse evitá-la. Moleques de carrinho corriam em todas as direções, atropelando-se uns aos outros. Queriam salvar as mercadorias que transportavam. Não era o instinto de propriedade que os impelia. Sentiam-se responsáveis pelo transporte. E no atropelo da fuga, pacotes rasgavam-se, melancias rolavam, tomates esborrachavam-se no chão. Se a fruta cai no chão, já não é de ninguém e sim de alguém, inclusive do transportador. Em ocasiões de assalto, quem vai reclamar uma penca de bananas meio amassadas? Olha o assalto! Tem um assalto ali adiante! O ônibuas na rua transversal parou para assuntar. Passageiros ergueram-se, puseram o nariz para fora. Não se via nada. O motorista desceu, desceu o trocador, um passageiro advertiu: No que você vai a fim de ver o assalto, eles assaltam sua caixa. Ele nem escutou.Então os passageiros também acharam de bom alvitre abandonar o veículo. Outros ônibus pararam, a rua entupiu. Todas as ruas estão bloqueadas. Assim eles não podem dar no pé. É uma mulher que chefia o bando. Já sei, a tal dondoca loura. A loura é em São Paulo, aqui é a morena. Uma gorducha, está de metralhadora. Eu vi. Vai ver que está é caçando marido. Não brinca numa hora dessas. Olha aí o sangue escorrendo! Sangue nada, é tomate! Na confusão, circularam notícias diversas. O assalto era a uma joalheria, as vitrinas tinham sido esmigalhadas a bala. E havia jóias pelo chão, braceletes, relógios. O que os bandidos não levaram, na pressa, era agora objeto de saque popular. Morreram no mínimo duas pessoas, e tres estavam gravemente feridas. Barracas derrubadas assinalavam o ímpeto da convulsão coletiva. Era preciso abrir caminho a todo custo. No rumo do assalto, para ver, e no rumo contrário, para escapar. Os grupos divergentes chocavam-se, e às vezes trocavam de direção: quem fugia dava marcha a ré, quem queria espiar era arrastado pela massa oposta. Os edifícios de apartamentos tinham fechado suas portas, logo que o primeiro foi invadido por pessoas que pretendiam, ao mesmo tempo, salvar o pêlo e contemplar lá de cima. Janelas e balcões apinhados de moradores que gritavam: _ Pega, pega! Correu pra lá! Eles entraram numa kombi ali adiante! Olha ela ali! É uma mascarada! Não, são duas! Ouviu-se nitidamente o pipocar de uma metralhadora à pequena distância. Foi um se jogar no chão geral, e como não havia espaço, uns caíam por cima dos outros. Cessou o ruído. Voltou. Que assalto era esse, dilatado no tempo, repetido, confuso? Olha o diabo daquele escurinho tocando matraca! E a gente com dor de barriga, pensando que era metralhadora! Caíram em cima do garoto, que sumiu na multidão e a gorda apareceu, muito vermelha berrando sempre: É um assalto! Chuchu por aquele preço é um verdadeiro assalto!

Sem comentários: