domingo, 1 de junho de 2008

Geléia de pêssego

Me aventurando, com mochila às costas, pelas montanhas de um pequeno país ao sul da África, eu carregava comigo alguns alimentos para o caso de não encontrar algo para comer. Eu sempre tinha algumas latas de espaguete, biscoitos, pasta de amendoim, e geléia.

Eu passava por um mercadinho certo dia e percebi um vidro de geléia de pêssego na prateleira. Eu já tinha visto algumas geléias em algumas lojas, até de morango. Mas de pêssego, a minha favorita, era a primeira vez que eu tinha visto. Agarrei-a, imediatamente.

Nos dias seguintes, quando eu sentia a necessidade de um pequeno deleite, eu removia a tampa com muito cuidado e colocava um pouco sobre um biscoito. Mmm, delicioso. Eu não dividia com ninguém. Sentava-me em segurança em algum canto e me deliciava.

Um tarde fria e nublada, eu esperava por um ônibus local, tremendo de frio e parecia que o ônibus nunca chegaria.

Começou a cair uma fina chuva e muito rapidamente a garoa se transformou em um aguaceiro. Todos a minha volta procuraram abrigo. Eu, por minha vez, encontrei abrigo sob uma espécie de varanda em um frágil barraco feito de bambu. Eu estava encharcado e procurei por alguma roupa seca em minha mochila.

Em minha desesperada afobação para evitar um maior desconforto, me esqueci que o frasco de geléia de pêssego estava enterrado em minha roupa. Um arranco forte e minha preciosidade foi ao chão, despedaçando-se.

Fiquei um tempo olhando entristecido para a lama, para aquilo em que se transformou minha geléia, lamentando minha perda. Foi quando observei aproximar-se uma velhinha. Olhou para mim, para a geléia e de volta para mim. Sem hesitar mais, ajoelhou-se e apanhou o que sobrou do frasco.

Ainda inclinada, meteu dois dedos no frasco, puxou a geléia pra fora e colocou na boca. Com cuidado, como com espinhos de peixes, cuspiu fora os gagos de vidro e chupou seu dedo, e repetiu tudo até extrair a última gota. Estudou bem o frasco quebrado até ter certeza que não havia mais nada.

Eu peguei minha mochila e, silenciosamente, lhe ofereci minhas latas de espaguete e meus biscoitos. Ela aceitou imediatamente. Entretanto, antes que eu pudesse lhe dar a manteiga de amendoim, ela correu apressada e eu fiquei prestando atenção enquanto ela se dirigiu até seu faminto neto na entrada do miserável barraco.

Quando o ônibus chegou, enquanto eu corria até ele, olhei para trás e ainda pude ver a criança limpando a boca.

E eu descobri que geléia de pêssego nunca mais teria o mesmo sabor.

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