quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Cáritas

Eu sou o sol que aquece a vida,
em nome da vida que criou o sol.
Sou eu quem reverdece o campo em beijos
cálidos após a demorada invernia.
Eu sou a força que sustenta as criaturas
tombadas, a fim de que se ergam,
e as desiludidas, para que recomecem
o trabalho do próprio crescimento.
Eu sou o pão que alimenta os corpos e as almas,
impedindo-os de experimentar deperecimento.
Sou eu a música que enternece o revoltado,
e sou o poema de esperança que
canta alegria onde houve devastação.
Por onde eu passo, um rastro luminoso fica
vencendo a sombra que cede lugar
à claridade libertadora.
Eu sou o medicamento que restaura as
energias abaladas, e sou o bálsamo que
suaviza o ardor das chagas
purulentas que levam à agonia
e à alucinação.
Sou a gentileza que ouve
pacientemente a narrativa
do sofrimento e nunca se cansa de ser solidária,
conquanto a aflição se espraie entre as criaturas.
Eu sou o fermento que leveda a massa
e dá-lhe forma para aprimorar-lhe o sabor.
Sou eu a paz que visita o terreno árido,
adornando-lhe a paisagem fúnebre.
Eu sou o perfume carreado pela brisa
mansa para aromatizar os seres e os jardins.
Sou eu a consolação que sussurra palavras de
fé aos ouvidos da amargura e soergue
aqueles que já não
confiam em ninguém, aturdidos pelas
frustrações e feridos
pelas dores pungentes.
Eu sou a madrugada que ressuscita
todos aqueles que são
tidos como mortos ou que estão
adormecidos, a fim de
que possam voltar ao convívio dos
familiares saudosos
e em angústias devastadoras.
Sou eu a água refrescante
que sacia a sede de todas
as necessidades e limpa os detritos
da alma degenerada,
preparando-a para os
renascimentos felizes.
Eu sou o hálito divino sustentando
a criação e penetrando
por todas as partículas de que se constitui.
Convido minha irmã, a fé, para que
ofereça resistência
ao viajor cansado e o alente em cada passo,
concedendo-lhe combustível para nunca desistir.
Eu me apoio na irmã esperança que possui
o encanto de reerguer e amenizar
a aspereza das provações.
Quando elas chegam, o prado queimado
se renova, porque se
me associam, fazendo que
arrebentem flores e frutos
onde a morte parecia dominar...
As duas, a fé e a esperança,
constituem os elementos vitais
da minha alma, a fim de que permaneça
conduzindo todos os seres.
O Senhor enviou-me em Seu nome, com
a missão de lembrar
a Sua presença no Mundo, desde quando me
usou para que as criaturas que Lhe
desafiaram a justiça
e a misericórdia, pudessem recomeçar
o processo de evolução.
Vinde comigo ao banquete suntuoso da ação
contínua do bem e embriagai-vos de felicidade.
Eu sou a caridade!

* * *

A caridade para ser legítima não dispensa
a fé que lhe oferece
vitalidade; e esta para ser nobre deve
firmar-se no discernimento
da razão como normativa salutar.

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